Jorge Dubman Dr Drumah
foto by Barbara Falcon

Entrevista: O afrofuturismo de Dr. Drumah em novo disco

Um dos bateristas mais ativos no atual cenário da música baiana, Jorge Dubman tem uma faceta pouco conhecida, mas que já vem colhendo bons frutos com produções próprias e em parceria com artistas internacionais. Sob a alcunha de Dr. Drumah ele acaba lançar o segundo EP, ‘Beyond Style – vol 02’, que mostra um trabalho de alto nível e revela um talento especial além daquele já mostrado atrás das baquetas da banda IFÁ Afobeat. Nessa entrevista, ele fala sobre essa produção, as influências, de onde traz suas referências, como produz e os trabalhos de alcance internacional que vem realizando com diversos parceiros.

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Gostaria que começasse contando sobre esse trabalho que você assina como Dr. Drumah. É uma faceta interessante, mas pouco conhecida. Como teve início e como você definiria?

Dr. Drumah é o pseudônimo que uso para assinar minhas produções como beatmaker. Iniciei em 2008 como produtor e assinava os beats como “Kzah 04 Beatz” (Casa 04 Beats), que era o número da casa onde morava no bairro de Castelo Branco. Um amigo músico, Jardel Cruz, me chamava de “Dr. Drumah”, porque ele achava que eu reproduzia de forma orgânica os delays na bateria. Pedi permissão a ele pra usar o nome e é como acabei assinando os beats. Esse trabalho é mais focado para a cultura do beat instrumental ou beat tapes, com forte influência de jazz rap, boom bap, old school, soulful style, afrobeat, funk, ethio grooves e afrofuturismo. Talvez esse meu trabalho seja desconhecido aqui em Salvador, mas no sul do Brasil e no exterior já acontece um pouco.


Cover art de Ilaria Di Stani

Você veio de um bairro de periferia de Salvador. Quais os caminhos de sua formação para chegar a essa sonoridade?

Isso veio de casa. Sempre escutei música de qualidade por conta dos meus pais: reggae, soul, funk, jazz e música brasileira. Isso com certeza ajudou na minha percepção musical. Sempre tive acesso a coisas de fora, porque tinha um amigo que viajava sempre pro exterior e quando voltava trazia muito CDs interessantes, que eu gravava em fitas K-7. Tinha um amigo de Detroit que foi o responsável por me apresentar vários nomes do hip hop norte americano, sendo nessa época quase impossível achar aqui esse material na Bahia e isso de uma forma ou de outra refletiu nessa minha sonoridade. Eu costumo sempre dizer que a minha maior formação é a auditiva, escuto muita música, pesquiso muito.

Trata-se um trabalho autoral e bastante pessoal. Como é a produção? Utiliza que equipamentos e ferramentas? Qual o processo de criação e produção? 

Para produzir, a maioria das vezes eu uso software de produção musica ou a MPC 1000, SPD-S, ou um sampler analógico Boss SP-303. Isso também depende muito da vibe que a música pede. O processo criativo vem de forma espontânea, às vezes eu estou escutando um LP de jazz e já identifico um loop para samplear. Daí começa o processo, que é a escolha do trecho que quero samplear, o corte perfeito do sampler, e é a partir desse sampler que tomo toda a direção da produção, estilo e conceito do beat, se quero algo mais 90’s ou um som mais futurista. E quando trabalho com sampler, costumo sempre gravar coisas somando com os sons que já vem no trecho sampleado, como gravar um Synth, um Rhodes uma bass Line e por aí vai.

Esse seu lado de produtor aparece não apenas nesse seu trabalho, mas em parcerias que você tem feito com diversos outros nomes. Com quem tem trabalhado e como foram feitas essas parcerias?

Na maioria das vezes as parcerias aconteceram naturalmente pela internet. Os parceiros, a grande maioria de fora do estado ou país, escutam o trabalho, se identificam e entram em contato. Isso acontece desde a época do myspace, hoje pelo soundcloud e bandcamp. Através desses contatos já produzi o EP World Wide Vibes do Mc Marchitect, integrante do grupo The 49ers de Delaware, nos EUA; produzi uma track em cada álbum The Jazzo Street Session Vol. 01 do Mc Glad2Mecha, e o 40 Pounds Of Soul do Mc Melodiq, ambos também dos EUA e de grande importância na cena alternativa de lá. Também trabalhei uma track no EP Nómada, da espanhola Indee Style; produzi três beats no álbum solo do Mc Gelleia, do grupo paulista Primeira Audição; além do EP 2Pra1 em parceria com o Mc Monge, de Belo Horizonte. Tem também uma produção minha no disco do Dialeto Sound Crew, de Brasília. Acabei de produzir recentemente a música “Santo Antônio” do Oxidantes daqui de Salvador, que tem também o videoclipe. Estou produzindo em parceria com Junix uns B-Sides, que estão em fase de seleção e logo mais disponibilizaremos na net para ouvir e baixar.


Esse uso de eletrônica tem ganhado força numa nova cena em Salvador, mas nunca foi muito comum. A que acha que se deve isso? Acha que a força da música orgânica aqui acaba inibindo essa produção?

Acho que não, cada um tem seu espaço e também suas misturas. Isso é o futuro, hoje em dia tudo está conectado e essa coisa hibrida não é mais aquele monstro que nos assustava. Hoje em dia todo garoto tem seu equipamento eletrônico e isso gera uma renovação na música. Temos o exemplo do Rafa Dias, com o projeto Atooxa, misturando as células do pagode e do arrocha com o eletrônico. Em 2010 eu vi na Europa o show do Buraka Som Sistema e pirei com esse mix de orgânico e eletrônico. Acho que as coisas estão caminhando junto e isso é um bom sinal.

Nesse tipo de som que você faz, quem enxerga fazendo algo na mesma linha, aqui na Bahia e no Brasil.

Bem, aqui em Salvador não conheço nenhum beatmaker fazendo um trabalho parecido com o meu. Conheço alguns e esses passeiam por outras vertentes. Em outros estados conheço beatmakers com influência de jazz, mas cada um na sua referência. Aqui no Brasil é difícil achar beatmakers fazendo a mesma linha de som que outros estão fazendo, a coisa é muito particular e os trabalhos tem identidade.

foto by Barbara Falcon
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Você lançou o segundo volume do projeto apenas de forma digital, certo? Pretende lança-lo em algum outro formato? 

Por enquanto só em formato digital mesmo. Alguns selos se interessaram em lançar em formato de fita K-7, as famosas beat tapes, mas não tem nada concreto. Infelizmente hoje ainda sai muito caro prensar mil copias para um artista independente. Então enquanto houver essas plataformas que possibilitam uma forma bacana de divulgar o trabalho, vou continuar nesse caminho.

Esse seu trabalho como Dr Drumah acaba ficando escondido atrás de outros projetos seus, pretende levá-lo aos palcos? É possível? Quais os próximos passos desse seu projeto?

Por tocar com um monte de artista e ter a IFÁ Afrobeat atualmente como o foco principal, essa coisa fica sempre em segundo ou último plano, por demanda de ensaios, gravações, criação de temas e etc., tanto na IFÁ quanto em outros projetos. Mas Isso é uma coisa a se pensar. Sofro algumas boas cobranças em mostrar isso “live” e pra mim vai ser um grande desafio, mas muito prazeroso também. Penso em fazer isso ao vivo numa formação de 3 pessoas eu (MPC+ bateria e samplers), baixo e teclados, estou amadurecendo a ideia e quando me sentir bastante seguro boto a cara na rua! Aguardem.

LINKS DR. DRUMAH:

BANDCAMP: http://drdrumah.bandcamp.com/

SOUNDCLOUD: https://soundcloud.com/drdrumah

SITE: http://www.jorgedubman.com/

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